sexta-feira, outubro 24, 2008
Crônicas de um Pássaro. Parte I
Hoje senti minhas asas crescerem, o medo se foi, por isso a bizarrissima metamorfose não foi algo assim tão ruim.
Tornar-se um pássaro, significa que chegou o momento da vida de se sair do ninho, criar asas e voar.
Mas o primeiro voo é complicado, sorte minha ter feito amigos na vizinhança. Um pássaro aliado, ainda desconhecido (ou não) por mim guiou meu voo, primeiro me ensinou seu canto, um cansativo e difícil movimento trêmolo com o diafragma misturado com uma tonalidade musical muito alta, que exige muita concentração para se reproduzir, mas que pareceu relaxar e preparar o meu corpo para o então seguido esforço mental, que seria a árdua tarefa de abrir as asas. Tem que ter muita resistência e autocontrole para conseguir suportar a agoniante extensão dos tendões por todo o corpo, exige visceras de aço e teria sido uma tarefa impossível sem ter aprendido o canto antes... Logo em seguida incentivou- me a tentar voar, seu canto, dessa vez distinto do que havia sido me ensinado antes foi logo seguido de uma orquestra de vários cantos de outros pássaros das redondezas, que foram surgindo aos poucos, alguns pertos e outros bem de longe. Parecia que ele estava pedindo aos outros para ajudar-lo a guiar-me, depois de muito sacrifício, finalmente abri as asas, me senti poderosíssimo encarando a liberdade, venci meu medo e fui.
Vi o lindo dourado do sol brilhar como um tapete de ouro por cima das árvores e do rio guaiba, lá das alturas tudo desaparece, e logo se esquece de tudo que está ficando pra trás, entregando-se exclusivamente ao prazer de sentir-se um ser realmente vivo, é incomparável
a qualquer outra coisa cotidiana, queria ir para sempre e nunca mais voltar, já estava quase me entregando totalmente para o infinito quando percebi o esforço tremendo dele em cantar cada vez mais alto, como se estivesse me chamando de volta, resisti mais um pouco, e resolvi voltar, foi ai que percebi que o seu canto era uma espécie de âncora guia, e que seria mesmo uma burrice minha partir sem a vigia dele. Após pousar de uma forma ridiculamente desajeitada
abri os olhos e seu canto parou.